RESUMO
Por se tratar de um tema altamente relevante para o aprendizado amplo e contínuo do Direito Penal Brasileiro, tivemos a preocupação de esboçar a história do direito penal brasileiro, destacando “a priori” as instituições indígenas, que nos mostra as diferentes formas e estágios da evolução na qual se processou as tribos indígenas após a colonização do Brasil. Logo à frente tratamos de discorrer acerca das ordenações do Reino que se deu por via das Ordenações Afonsinas, Manuelinas e Filipinas. Tratamos ainda de fazer alusão ao Período Imperial que por meio do Código Criminal do Império, destacou-se como sendo de suma importância para diversos Códigos Penais de países da América Latina. Destacamos ainda o Período Republicano, o Código Penal de 1940 e o Código Penal de 1969.
Palavras chave: história, evolução, direito penal
Because it is a topic highly relevant to the broad and continuous learning of the Brazilian Penal Law, had the desire to sketch the history of Brazilian criminal law, noting "a priori" indigenous institutions, which shows the different forms and stages of evolution in which the Indian tribes sued after the colonization of Brazil. Just ahead we try to discuss about the ordinances of the Kingdom which has the path of Alfonsine Ordinances, Manuelinas and the Philippines. We deal also alluded to the Age of Empire that through the Criminal Code of the Empire, stood out as being of great importance to the criminal law of several countries in Latin America. We also highlight the Republican period, the 1940 Penal Code and the Penal Code of 1969.
Keywords: history, evolution, law
SUMÁRIO: I – AS INSTITUIÇÕES INDÍGENAS; II - ORDENAÇÕES DO REINO; III - PERÍODO IMPERIAL; IV - PERÍODO REPUBLICANO; V - CÓDIGO PENAL DE 1940; VI - O CÓDIGO PENAL DE 1969; VII – BIBLIOGRAFIA;
I - AS INSTITUIÇÕES INDÍGENAS
No início da colonização do Brasil, as tribos que já existiam no país, apresentavam diferentes estágios de evolução, sendo que os indígenas chamados de tupis apresentavam um desenvolvimento muito superior ao dos chamados tapuias, que por sua vez eram considerados bárbaros pelos primeiros.
À época, toda idéia que se possa ter de Direito Penal entre os indígenas, está intimamente ligada ao direito costumeiro, razão pela qual era comum a prática das chamadas justiças por meio da vingança privada, vingança coletiva e o talião.
Existem relatos de que até o descobrimento, a guerra nunca era movida por motivos econômicos, sendo assim, os motivos das hostilidades se resumia em capturar prisioneiros para os ritos antropofágicos, a tomada de troféus ou para vingar os parentes mortos.
As crianças da época eram castigadas para que aprendessem a urbanidade. “A polidez e o respeito mútuo eram encarados como a forma ideal para dirigir a vontade dos filhos e incitá-los aos exemplos dos mais velhos”. (História do Brasil, v. 1°, pág. 44, Ed. Bloch.)
O renomado autor Martins Júnior (1985, p.114), em uma peculiar obra característica do direito nacional histórico, ensina que historiadores nacionais “costumam dedicar aos primitivos habitantes do Brasil, páginas inteiras relativas a certas instituições ou usos selvagens de alçada perfeitamente jurídica”.
Naquela época era perfeitamente normal a prática da poligamia, apesar de haver casamento monogâmico, e na maioria das vezes os costumes tinham como base o sistema patriarcal e o parentesco só se transmitia pelo lado paterno.
Notamos, portanto, uma descomunal diferença dos povos daquela época com os da sociedade de hoje, tida por moderna, e acerca disso, doutrinas citam o exemplo de que o furto a estrangeiros e a hóspedes que não fossem conhecidos era perfeitamente lícito, o que vai de encontro com toda a sistemática penal de hoje, e ainda, o adultério que na maioria das vezes era fato indiferente, entretanto quando muito, dava precedentes ao espancamento da mulher que praticava.
Desta forma, podemos afirmar que as práticas punitivas das tribos selvagens que habitavam o nosso país, em momento algum tiveram influência na nossa legislação, uma vez que se perfaziam como sendo exacerbadamente primárias.
II - ORDENAÇÕES DO REINO
A história do Direito Penal no Brasil registra a existência de cinco Códigos Penais, desde o período colonial até os nossos dias. O Direito Penal que vigorou no Brasil, desde o seu descobrimento até a independência, tinha por fonte o Livro V das Ordenações do Reino.
As Ordenações Afonsinas começaram a vigorar logo após o descobrimento do Brasil, sendo estas mandadas compor por D. João I.
Em 1446 foi concluído o trabalho que teve ampla influência do direito canônico e do direito romano, tendo trabalhado no projeto inicial o Mestre João Mendes, que após longos anos de compilação não teve condições de terminá-lo juntamente com um renomado jurista da época que atendia pelo nome de Rui Fernandes. Em virtude disso, D. Manoel incumbiu os juristas Rui Boto, Rui da Grã e João Cotrim para concluírem o trabalho. Interessante ressaltar que uns autores dizem que D. Manoel pretendia com tal atitude, dotar o país de uma legislação mais perfeita, no entanto, outros afirmam que tal atitude foi tomada por mera vaidade.
Ao término da referida obra, a mesma veio a ser impressa no ano de 1512, e foi publicada com o nome de Ordenações Manuelinas, levando-se destarte o nome daquele que incumbiu os juristas de concluírem o trabalho.
Por fim, o rei Felipe II da Espanha, que detinha seu reinado em Portugal com o nome de Felipe I, ordenou que fosse feita uma nova estruturação dos Velhos Códigos, sendo assim, incumbiu os desembargadores do Paço, Paulo Afonso e Pedro Barbosa para desempenharem a árdua tarefa, sendo que eles ainda contaram com a colaboração de outros dois renomados juristas da época conhecidos por Damião de Aguiar e Jorge Cabedo.
Após as devidas revisões feitas por outros renomados juristas da época, foram publicadas as Ordenações Filipinas no dia 11 de janeiro de 1603, sendo que naquela época, Felipe II de Portugal é quem exercia o reinado. Cumpre ressaltar que ao ser restaurada a monarquia portuguesa, as Ordenações Filipinas foram revalidadas pela lei de 29 de janeiro de 1643, de D. João IV.
Sendo assim, as legislações Afonsinas não chegaram a influir no Brasil, ressalvadas as disposições que foram enxertadas nas Ordenações Manuelinas.
As Ordenações Manuelinas chegaram a ter alguma aplicação no período das capitanias hereditárias, principalmente nas de São Vicente e Pernambuco que haviam prosperado mais, e bem mais ao tempo dos chamados governadores gerais.
Durante o regime das capitanias, o que de fato regia era o arbítrio do donatário, um direito na época tido por informal e personalista, até porque as cartas de doação entregavam aos donatários o exercício de toda justiça.
Ao tempo dos governadores gerais, mais centralizado e com uma administração da justiça mais disciplinada, tornou-se um pouco mais efetiva a aplicação da legislação do reino.
De todas as Ordenações existentes, é correto afirmar que as Ordenações Filipinas foram as que mais tiveram aplicação. Relatos nos dizem que o referido código era repleto de prejuízos da época, pois caracterizava-se pela multiplicidade injustificada de infrações penais e como se não bastasse, pela forma rígida e exacerbada das punições aplicadas nos infratores e/ou criminosos da época.
Em uma síntese perfeita do que correspondia o livro V das Ordenações Filipinas, Batista Pereira (1932, v II, p. 14,15) assim manifestou-se:
Espelho, onde se refletia, com inteira fidelidade, a dureza das codificações contemporâneas, era um misto de despotismo e de beatice, uma legislação híbrida e feroz, inspirada em falsas idéias religiosas e políticas, que invadindo as fronteiras da jurisdição divina, confundia o crime com o pecado, e absorvia o indivíduo no estado fazendo dele um instrumento. Na previsão de conter os maus pelo terror, a lei não media a pena pela gravidade da culpa; na graduação do castigo obedecia, só, ao critério da utilidade. Assim, a pena capital era aplicada com mão larga; abundavam as penas infamantes, como açoite, a marca de fogo, as galés, e com a mesma severidade com que se punia a heresia, a blasfêmia, a apostasia e a feitiçaria, eram castigados os que, sem licença de El-Rei e dos Prelados, benziam cães e bichos, e os que penetravam nos mosteiros para tirar freiras e pernoitar com elas. A pena de morte natural era agravada pelo modo cruel de sua inflição; certos criminosos, como os bígamos os incestuosos os adúlteros, os moedeiros falsos eram queimados vivos e feitos em pó, para que nunca de seu corpo e sepultura se pudesse haver memória. Com a volúpia pelo sangue, negação completa de senso moral, dessa lei que, na frase de Cícero, é in omnibus diffusa, naturae, congruens, constans, eram supliciados os réus de lesa-magestade, crime tão grave e abominável, e os antigos sabedores tanto o estanharam, que o compararam à lepra, porque, assim como esta enfermidade enche o corpo, sem nunca mais se poder curar, assim o erro da traição condena o que a comete, e impece e infama os que da sua linha descendem, posto que não tenham culpa. A este acervo de monstruosidade outras se cumulavam; a aberrância da pena, o confisco de bens a transmissibilidade da infâmia do crime.
Mesmo com a vinda de D. João VI ao Brasil e a elevação do país à condição de Reino Unido, a legislação em nada modificou, sendo que até mesmo D. Pedro I, que havia baixado as bases da constituição Política da Monarquia, na data de 10 de março do ano de 1821, por meio da lei de 20 de outubro de 1823, determinou que as Ordenações permanecessem em inteiro vigor na parte em que não tivessem sido revogadas, para por meio delas se regularem os negócios do interior do Império.
III - PERÍODO IMPERIAL
O livro que tratava da Constituição do Império, mais precisamente em seu artigo 179, § 18, impunha a urgente organização de “um Código Criminal, fundado nas sólidas bases da justiça e da equidade”.
Vale observar que ao aproveitar o referido dispositivo, os movimentos liberais e as novas doutrinas penais, aliadas às modificações sociais do tempo, acabaram por impor que suas referidas concepções pudessem ser influídas na nova legislação. A própria Constituição do Império já determinava claramente em seu artigo 179, a igualdade de todos perante a lei; a não retroatividade da lei penal e que a pena não passaria da pessoa do delinqüente, o que não se faz diferente dos ordenamentos atuais.
Ainda que tenha sido determinada a elaboração do Código com caráter de urgência na Carta de 1824, apenas no dia 16 de dezembro do ano de 1830, portanto, seis anos após, é que foi sancionado com o nome de Código Criminal do Império, tendo sido considerado um código liberal para época e com os avanços técnicos trazidos pela legislação penal Francesa, sobretudo o Código de Napoleão de 1810.
Acerca do projeto Bernardo Vasconcelos, assentaram os trabalhos da comissão mista da Câmara e do Senado, o que fez com que o Código se constituísse numa obra merecedora de louvores dos penalistas de seu tempo.
Autores fazem referências de que tal obra foi tão admirada, que penalistas como Haus e Mittermayer aprenderam o português exclusivamente para ler a obra no original.
No referido Código encontrava-se presentes as idéias de Bentham, que teve grande influência na elaboração dos Códigos Francês de 1810 e Napolitano de 1819, com os quais guardam em vários trechos grandes proximidades.
É de suma importância registrar que o nosso Código Criminal do Império contribuiu muito para elaboração do Código Penal Espanhol de 1848 e por via deste, em vários Códigos Penais de países da América Latina. Teve a sua grande parcela de contribuição também para a elaboração do Código Penal Português, o primeiro que fora promulgado no séc. XIX.
Ainda que com todo o seu avanço, o referido código preconizava o regime servil, uma vez que a escravidão era tida como uma instituição do Estado, e ainda, a pena de morte que os códigos subseqüentes aboliram.
Roberto Lyra (1946, p.89) em uma obra dinâmica enumerou as originalidades do referido Código, vejamos:
1. No esboço da indeterminação relativa e de individualização da pena, contemplando, já, os motivos do crime, só meio século depois tentado na Holanda e, depois, na Itália e na Noruega;
2. Na fórmula da cumplicidade (co-delinqüência como agravante) com traços do que viria a ser a teoria positiva a respeito;
3. Na previsão da circunstância atenuante da menoridade, desconhecida, até então, das legislações francesa, napolitana e adotada muito tempo após;
4. No arbítrio judicial no julgamento dos menores de 14 anos;
5. Na responsabilidade sucessiva nos crimes por meio da imprensa antes da lei belga, e, portanto, esse sistema é brasileiro e não belga, como é conhecido;
6. A indenização do dano ex-delicto como instituto de direito público, também antevisão positivista;
7. Na imprescritibilidade da condenação.
O referido Código, como todos os demais não era perfeito, razão pela qual recebeu uma série de críticas, principalmente por parte de Tobias Barreto, que dentre muitas, alegava que não se definia a culpa, referindo-se apenas ao dolo. Entretanto, a referida lacuna era indiferente para a época, sendo que somente com o desenvolvimento dos meios de transportes passou a se exigir uma elaboração por meio do legislativo, o que ocorreu em 1871.
Embora a Constituição da época assegurasse a igualdade de todos perante a lei, o escravo recebeu tratamento desigual, sendo que a eles ficaram reservadas além das penas comuns, as penas de galés e a pena de morte, o que provocou debates acirrados durante a sua elaboração.
Com o advento da Lei Áurea, Joaquim Nabuco e João Vieira de Araújo apresentaram projetos que visavam a reforma do Código Penal, para que pudesse adapta-lo à nova situação dos negros que até aqueles tempos eram considerados escravos, no entanto, tais projetos não foram apreciados e conseqüentemente não foram votados, uma vez que o governo encarregou Batista Pereira de elaborar o respectivo projeto.
Dentre muitos penalistas patrícios que se projetaram durante o período imperial, o que mais se sobressaiu na época foi Tobias Barreto que foi autor de várias obras consagradas, dentre elas, a considerada mais importante intitulada de “Delitos por Omissão”, onde analisou aspectos desconhecidos para a maioria dos especialistas da época.
IV - PERÍODO REPUBLICANO
Com a proclamação da República, o trabalho desenvolvido por Batista Pereira foi interrompido, entretanto, o então Ministro da Justiça do governo provisório, Campos Sales, renovou-lhe o encargo de preparar o novo Código Penal, trabalho que foi terminado em pouco tempo e remetido à apreciação de uma comissão de juristas que foi presidida pelo próprio ministro.
Em 11 de outubro do ano de 1890, foi o Código transformado no “Código Penal Brasileiro”, e por decreto datado em 6 de dezembro do mesmo ano, foi marcado o prazo de seis meses para a sua execução em todo o território nacional.
Aníbal Bruno (v.1, p.166) lembra que:
O primeiro Código Penal da República foi menos feliz que o seu antecessor. A pressa com que foi concluído prejudicou-o em mais de um ponto, e nele a crítica pode assinalar, fundadamente, graves defeitos, embora muitas vezes com excesso de severidade. Não tardou a impor-se à idéia de sua reforma, e menos de três anos depois de sua entrada em vigor, já aparecia o primeiro projeto de Código para substituí-lo.
João Monteiro, por sua vez, alegou ter sido o pior Código de todos e como se não bastasse, Plínio Barreto também não lhe poupou críticas.
As deficiências do referido código eram realmente notáveis e foi preciso desde logo alterá-lo por via de inúmeras leis, procurando-se suprir as falhas constantes no mesmo.
Tamanhas foram as deficiências que o código de 1890 havia incriminado a greve pacífica em seu art. 206, mas tal reação provocou uma repulsa tão grande que foi necessário modificá-la de pronto, o que foi feito por via do Decreto Lei de 12-12-1890, ou seja, dois meses após o aparecimento do código.
Entre os atos legislativos mais importantes que se sucederam, estão os Decretos Leis de 2.110, de 30-09-1909, e 4.780, de 27-12-1923, que dispunha acerca do peculato, moeda falsa e outras falsificações; o Decreto Lei 2.321, de 30-12-1910 que versou sobre loterias e rifas; a Lei 2.992, de 25-09-1915, chamada de Lei Mello Franco, com novas disposições para a repressão do lenocínio e atentados ao pudor, conforme as conclusões da Conferência de Paris, de 1902; a Lei 3.987, de 02-01-1920, e o Decreto Lei 14.354 de 15-09-1920, sobre falsificação e adulteração de gêneros alimentícios e medicinais; o Decreto 4.269, de 17-01-1921, sobre repressão ao anarquismo; o Decreto Lei 4.292 de 06-07-1921, sobre venda de entorpecentes; as leis de imprensa, de 1923 e 1934; bem como o Decreto 16.588 de 06-09-1924, que introduziu na nossa legislação a suspensão condicional da pena, e o Decreto 16.665 de 06-11-1924, que regulou o livramento condicional.
Vale ressaltar que essas duas últimas medidas já eram reclamadas há muito pelas novas idéias que então vigoravam, contra o cumprimento das penas privativas da liberdade de curta duração, favorecendo a liberação do réu antes de finda a pena e estimulando seu bom comportamento carcerário.
O Código de Menores que surgiu em 1927 trouxe também alterações significativas a muitas disposições penais relativas a menores existentes no Código Penal na época.
Apesar de todas as críticas vexatórias recebidas, o Código resistiu firmemente às idéias reformistas e foi recebendo alterações e aditamentos, conforme demonstrado acima, que tinham por fim precípuo sanar os defeitos, completá-lo em alguns pontos e até ajustá-lo às novas condições.
Na época, o Desembargador Vicente Piragibe foi quem compilou as leis esparsas que visavam a retificação ou complementação do Código, sistematizando-as em um corpo de dispositivos que passou a ser chamados de Consolidação das Leis Penais, obra de grande valor, pois facilitava imensamente a todos quantos tinham de indagar qual o direito penal vigente, sendo oficializada por meio do decreto de 14 de dezembro do ano de 1932.
Como referido na Exposição de Motivos do Código Penal vigente, com o Código de 1890 nasceu a tendência de reformá-lo.
Pois bem, em 1891 foi nomeada na Câmara dos Deputados uma comissão para efetuar a revisão do código, no qual presidiu João Vieira de Araújo que era professor da Faculdade de Direito do Recife, e em 1893 o mesmo apresentou à Câmara dos Deputados um projeto de reforma, projeto este que embora revelasse um progresso em relação ao código vigente da época, também não deixou de apresentar falhas.
Logo após, em análises feitas e pareceres opostos redigidos acerca do projeto, merecem citação o parecer feito por Batista Pereira em nome do Instituto da Ordem dos Advogados do Brasil e ainda do Prof. João Monteiro, em nome da Faculdade de Direito de São Paulo.
Pouco tempo depois, em virtude dos pareceres opostos, João Vieira apresentou um substitutivo que foi aprovado pela Câmara, mas não teve seguimento no Senado.
Em 1910, o então Ministro Esmeraldino Bandeira alegava a extrema e urgente necessidade da substituição do código, tendo o congresso no ano seguinte, ou seja, em 7 de janeiro de 1911 autorizado o Poder Executivo a realizar um projeto de reforma, o que não resultou em nada.
Em 1913, Galdino Siqueira apresenta ao governo um projeto de código, que nem sequer foi objeto de estudos por parte do Poder Legislativo.
Em 1916 foi a vez do Instituto da Ordem dos Advogados na cidade do Rio de Janeiro, pleitear uma urgente reforma das Leis Penais vigentes à época.
O desembargador Sá Pereira incumbiu-se da elaboração do novo projeto, por determinação expressa do Governo Arthur Bernardes, sendo publicado sua parte geral no Diário Oficial em 10 de novembro de 1927, e ainda, em 23 de dezembro de 1928 foi publicado o projeto completo com toda parte geral reformulada.
É de se ressaltar que tal projeto foi intimamente influenciado pelo Projeto do Código Penal Suíço, da lavra de Stoos, bem como dos projetos sueco e italiano (projeto Rocco), e ainda pelo Código Penal da Argentina, o que se fazia perceptível em sua leitura, e por mais uma vez não prosperou, embora considerado uma obra digna do desenvolvimento da ciência jurídica na época.
Em 1930, iniciou a Câmara dos Deputados o exame do referido projeto, quando sobreveio a revolução que levou Getúlio Vargas ao poder.
O governo provisório determinou a revisão do projeto por uma subcomissão legislativa, de que fazia parte Sá Pereira, Evaristo de Morais e Mário Bulhões Pedreira, preparando-se assim um projeto revisto, que foi dado à luz em 1935.
Por mais uma vez as críticas ferrenhas se fizeram presentes, principalmente aquelas exaradas na Conferência Brasileira de Criminologia que fora realizado na cidade do Rio de Janeiro em 1936 que desgastaram em muito o referido Projeto, e por fim, o motivo maior do fracasso se deu em virtude do golpe de Estado ocorrido em 10 de novembro de 1937 que dissolveu o Congresso que por sua vez não aproveitou o projeto, sepultando-o de vez.
Dois outros Códigos completam o período republicano, sendo eles o Código Penal de 1940 e o Código Penal de 1969, abaixo analisados.
V - CÓDIGO PENAL DE 1940
Ao instaurar-se um novo regime no Brasil, intitulado de Estado Novo, o então Ministro Francisco Campos incumbiu o Prof. Alcântara Machado de elaborar um anteprojeto do Código Penal, que por sua vez desincumbiu-se logo e no dia 15 de Maio de 1938, apresentando um anteprojeto da Parte Geral, completando o trabalho em agosto do mesmo ano publicando destarte, o “Projeto de Código Criminal Brasileiro”, já constando a exposição de motivos.
A revisão do projeto foi composta por uma comissão de renomados juristas da época, dentre eles faz-se constar: Nelson Hungria, Roberto Lyra, Narcélio de Queiroz e Vieira Braga, tendo também colaborado o grande mestre Costa e Silva.
Curiosamente, ao mencionar o nome de Costa e Silva como componente da referida revisão, o mesmo afirma que não participou da comissão por motivos de saúde, afirmando ainda que sua colaboração resumiu-se apenas para encaminhar sugestões à comissão constituída pelo Governo. Ao final, o certo é que o próprio Costa e Silva afirma que muitas de suas idéias foram consagradas pelo código, o que nos leva a crer que por meio desta afirmação o mesmo confessa ter participado da referida comissão. (A J. da Costa e Silva, Direito Penal, vol. 1, págs. 8 e 9, ed. da companhia Editora Nacional.)
Houve grandes divergências entre Alcântara Machado e a comissão revisora, tendo em vista que o projeto deste foi substancialmente modificado, embora sobre seu projeto desenvolveu-se o trabalho de onde originou-se o novo Código, que por sua vez, foi sancionado em 7 de dezembro de 1940 e entrou em vigor em 1° de janeiro de 1942.
Embora o Código de 1940 tenha partido do Projeto Alcântara Machado, o mesmo teve em sua mira o Projeto Sá Pereira e ainda, projetos de Códigos originados da Europa cuja corrente chamada política criminal, acabou por filiar-se ao nosso estudo.
Para Nélson Hungria (v.1, p.127) “o projeto Alcântara Machado está para o Código Penal, como o projeto Clóvis está para o Código Civil”.
Basileu Garcia (v.1, p.127) por sua vez, afirma que “o Código não corresponde exatamente ao Projeto Alcântara Machado, pois muitas modificações viscerais foram realizadas pela comissão”.
O Ministro Francisco Campos na Exposição de Motivos de n° 86, afirmou que “da revisão resultou um novo projeto”, seguindo destarte, a mesma linha de pensamento que Basileu Garcia. Sob o mesmo prisma, temos as palavras de Costa e Silva (v.1, p.8) sobre a mesma temática:
O projeto Alcântara Machado foi, como se exprimiu o Ministro Francisco Campos, um grande passo para a reforma da nossa lei penal. Nada mais do que isso. Entre ele e o Código encontram-se numerosos pontos de semelhança: são aqueles em que ambos (às vezes com pouca felicidade) copiaram os seus modelos prediletos – o código italiano e o suíço. Mas traços inconfundíveis os distinguem. Há mais originalidade na obra da comissão do que na do professor paulista. A sua técnica é mais perfeita.
Doutrinadores da época, e hoje não é diferente, afirmam que o Código de 1940 se perfaz como sendo uma obra eclética, tendo em vista que concilia no seu texto as idéias dos neoclássicos com o positivismo, ficando salientado pela própria Exposição de Motivos.
Como qualquer outra obra de tamanha grandeza, o referido Código não poderia ser diferente dos demais e apresentou alguns defeitos que ficaram evidentes ao serem demonstrados ao longo dos seus trinta e sete anos de aplicação, mesmo assim é considerado como uma obra ímpar no meio da ciência penal do país, tanto é que se tornou uma obra recebedora de vários elogios referenciais da crítica estrangeira.
Embora tenha sido elaborado durante um regime ditatorial, o Código penal de 1940 incorpora fundamentalmente as bases de um direito punitivo democrático e liberal, sendo que seu único vestígio autoritário aparece na disciplina dos crimes contra a organização do trabalho, que, inspirada no direito italiano, estabelece sistema de excepcional rigor na repressão dos ilícitos penais relacionados com a greve, que se configura com a mera paralisação do trabalho com o concurso de pelo menos três empregados (art. 200, Parág. único, Código Penal).
A legislação penal foi complementada com o surgimento da Lei das Contravenções Penais em 1941, ainda em vigor e diversas outras leis penais extravagantes, tais como: o Código Penal Militar, de 1944 (substituído posteriormente pelo Código de 1969); Lei de Imprensa, de 1953 (substituída posteriormente pela Lei n° 5.250, de 1967 e que recentemente foi declarado pleno do STF a sua não recepção pela CF/88 ); Lei de economia popular (Lei n° 1.521, de 1951); Lei de segurança do Estado, de 1953 (revogada posteriormente pelo Decreto-Lei n° 898, de 1969).
Têm-se ainda os dispositivos concernentes aos crimes falimentares (previstos no Dec.-Lei nº 7.661/45 atualmente substituído pela Lei 11.101/2005); os crimes contra a propriedade industrial (previstos no Código de Propriedade Industrial, DL n° 7.903, de 1945); os crimes de responsabilidade (Lei n° 1.907, de 1950, e DL n° 201, de 1967); os crimes eleitorais (previstos no Código Eleitoral, Lei n° 5.197, de 1967), os crimes florestais (previstos no Código Florestal, Lei n° 4.771, de 1965) e por fim, crimes de pesca, previsto no Decreto-Lei n° 221, de 1967.
Permanece, portanto, em vigor, o Código Penal de 1940, com algumas alterações que lhe foram introduzidas, dentre as quais as referentes à lei de n° 6.416 de 1977, que inseriu em seu bojo os estabelecimentos penais semi-abertos e abertos, de que é espécie a prisão-albergue.
O Código Penal vigente é dividido pela parte geral, que cuida dos lineamentos de todo o sistema penal e a parte especial, que descreve as figuras típicas, ou crimes.
A parte geral compreende-se de oito títulos, dando-se as penas e medidas de segurança. A parte especial por sua vez, possui onze títulos, cada qual refere-se a um bem jurídico tutelado como a vida, o patrimônio, a propriedade imaterial, a organização do trabalho, os costumes, a família, dentre outros.
No dia 3 de outubro do ano de 1941, foi promulgado o Código de Processo Penal e na mesma data a Lei das Contravenções Penais, surgindo logo após o Código Militar, mais precisamente em 24 de janeiro de 1944.
É importante salientar que ao longo do tempo surgiram diversas obras de diversos juristas brasileiros, umas abrangendo apenas a parte geral, outras a parte especial e por fim algumas interpretam todo assunto proposto, o que nos leva a concluir que o referido Código contribuiu sistematicamente com o desenvolvimento na literatura penalista pátria.
VI - O CÓDIGO PENAL DE 1969
Com o restabelecimento da Democracia em 1945 e com o advento de uma nova Constituição em 1946, pensou-se logo em um novo Código Penal, sendo assim, o douto jurista Nelson Hungria que foi ministro do Supremo Tribunal Federal e revisor do anteprojeto que transformou-se no Código Penal de 1940 destacou ao governo a incumbência de elaborar o anteprojeto de Código Penal, sendo este apresentado em 1963 e divulgado amplamente para que pudesse receber as mais diversas sugestões, dentre muitas, destaca-se as ofertadas pelos Conselhos da Ordem dos Advogados e ainda, aquelas obtidas pelo ciclo de conferências e debates realizados em São Paulo, sob os cuidados do Instituto Latino Americano de Criminologia, oportunidade em que o insigne penalista teve a oportunidade de ouvir as mais diversas críticas acerca do seu trabalho e ainda, pode rebater algumas acatando por fim, as mais condizentes.
No ano de 1964, o então Ministro Francisco Campos designou uma comissão revisora da qual fizeram-se presentes os professores Aníbal Bruno, seu presidente, Heleno Cláudio e por fim o próprio autor do anteprojeto, cujo trabalho mesmo após as devidas revisões, não foi divulgado.
Submeteu-se o projeto novamente a uma outra revisão composta pelos professores Beijamin Moraes Filho, Heleno Cláudio Fragoso e Ivo D’Aquino, “levando-se em conta, inclusive, a necessidade de uniformizar os textos dos projetos de Código Penal e de Código Penal Militar”.(Exposição de Motivos, do Ministro Luiz Antonio da Gama e Silva (n° 2)).
Mesmo não havendo a pretensão de se elaborar um Código totalmente novo, haja vista que o Governo considerava o Código de 1940 como a melhor codificação feita até então, um inovador estatuto que foi convertido em lei por via do Decreto-lei n°1.004, de 21 de outubro de 1969, de pronto começou a ser bombardeado com inúmeras críticas, dentre muitas, cabe-nos citar a adoção da pena indeterminada, que foi considerada uma inovação absurdamente inviável e ainda, a redução prevista para dezesseis anos a idade mínima para a imputabilidade, sendo esta dependente de exame criminológico para verificar a devida capacidade de entendimento e auto-determinação do agente.
O Código original sofreu algumas alterações em 31 de dezembro de 1973, por meio da lei n° 6.016/73, atendendo-se a muitas das críticas formuladas, no entanto, foi derrogado sem nunca entrar em vigor. A referida Lei que tinha sua vigência determinada para o dia 1° de agosto de 1970 era adiada constantemente (adiamento que se deu por quase dez anos), sob as alegações de que seria mais viável que a mesma entrasse em vigor juntamente com o novo Código de Processo Penal, cujo projeto foi de autoria do Prof. Frederico Marques e chegou a tramitar pelo Congresso Nacional.
Interessante frisar que entremeio tantas críticas desfavoráveis na época, o novo Código foi reverenciado por Pietro Nuvolone (1974, p.31/38) que afirmou:
[...] este Código apresenta-se, no momento histórico atual, como uma tentativa de aplainar conceitualmente antíteses substanciais, de indicar, aos esquemas tradicionais, com instrumentos diversos, novos caminhos para resolver o problema da luta contra a criminalidade.
VII – CONCLUSÃO
Em síntese, vigoraram no Brasil as Ordenações Afonsinas, Manuelinas e Filipinas seguindo-se do Código Criminal do Império em 1830, o Código Penal Republicano de 1890 e a Consolidação das Leis Penais de 1932.
Atualmente vigora no Brasil o estatuto do Código Penal de 1940 (Dec. Lei n°2.848, de 7-12-40), que sofreu importantes alterações em 1977 ( Lei 6.416, de 24-05-77), uma reformulação de sua Parte Geral em 1984 (Lei 7.209, de 11-07-84) e mais recentemente alterações em sua Parte Especial por meio da Lei 12.015/2009.
VIII - BIBLIOGRAFIA:
BARBOSA, Licínio. Direito Penal e Direito de Execução Penal; Prefácio: Prof. René Ariel Dotti. Goiânia –GO.
BRUNO, Aníbal. Direito Penal. v. I. tomo 1, pág. 166.
COSTA E SILVA, A J. Direito Penal. v. I. p. 8 e 9. ed. da companhia Editora Nacional.
FRAGOSO, Heleno Cláudio. Lições de Direito Penal (Parte Geral). 4. ed. Rio de Janeiro. Forense.
FUHRER, Maximilianus Cláudio Américo. Resumo de Direito Penal (Parte Geral). 20.ed. São Paulo. Malheiros Editores. 2002.
LYRA, Roberto. Introdução ao Estudo do Direito Criminal. p.89.ed. Nacional de Direito.1946.
MARQUES, José Frederico. Cfr. Em Tratado de Direito Penal. vol 1. pág. 85; Vicente Piragibe. Legislação Penal. 1932, v.III. p. 14 e 15.
PIERANGELLI, José Henrique (Coordenador). Códigos Penais do Brasil – Evolução Histórica. 1 .ed. São Paulo. Javoli, 1980.
Conferência proferida no Tribunal de Alçada Criminal de São Paulo, 08. 1974. Revista Justitia. v. 87. p.31 a 38.
Mestre em Direito, Relações Internacionais e Desenvolvimento pela Pontifícia Universidade Católica de Goiás (PUC-GO). Especialista em Direito Penal pela Faculdade de Direito da Universidade Federal de Goiás (UFG-GO). Especialista em Docência do Ensino Superior (FTD). Professor na graduação em Direito (PUC-GO; Faculdade Alves Faria - ALFA e Faculdade Cambury), na Pós-Graduação em Direito da Faculdade Montes Belos e no MBA em Gestão Prisional da Unievangélica. Palestrante em diversos eventos. Advogado militante na área criminal.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: JUNIOR, Euripedes Clementino Ribeiro. A história e a evolução do Direito Penal brasileiro Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 16 nov 2009, 10:52. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos /18780/a-historia-e-a-evolucao-do-direito-penal-brasileiro. Acesso em: 28 dez 2024.
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